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O Circo, ESTAMOS DE MUDANÇA

Pintar, vestir, Virar uma aguardente para a próxima função Rezar, cuspir, Surgir repentinamente na frente do telão Mais um dia, mais uma cidade pra se apaixonar Querer casar, pedir a mão Saltar, sair, Partir pé ante pé antes do povo despertar Pular, zunir, Como um furtivo amante antes do dia clarear Apagar as pistas de que um dia ali já foi feliz Criar raiz e se arrancar Hora de ir embora, quando o corpo quer ficar Toda alma de artista quer partir Arte de deixar algum lugar Quando não se tem pra onde ir Chegar, sorrir, Mentir feito um mascate quando desce na estação Parar, ouvir, Sentir que tatibitati que bate o coração Mais um dia, mais uma cidade para enlouquecer O bem querer, o turbilhão Bocas, quantas bocas a cidade vai abrir Pr'uma alma de artista se entregar Palmas pro artista confundir Pernas pro artista tropeçar Voar, fugir, Como o rei dos ciganos quando junta os cobres seus Chorar, ganir, Como o mais pobre dos pobres dos pobres dos plebeus Ir deixando a pele em cada palco e não olhar pra trás E nem jamais, jamais dizer Adeus

Na Carreira de Edu Lobo Ontem eu estive aqui, num paraíso chamado Circo, e o que vi era um espaço pequeno demais para tanta alegria; havia luzes, brilho, som, uma festa enfim.

O coração de cada pequenino estava acelerado pela expectativa, e apertavam a mão dos pais com força, como se pudessem adiantar o relógio com esse movimento.

A festa começou!

E felizes desfilaram reis e rainhas, na figura cômica dos palhaços, na imagem trágica do trapezista, na ternura que pairava no olhar da elefanta Carla, na valentia dos leões, no equilibrista, desfilaram enfim, aqueles que são reis da alegria, que conseguem comover uma criança, enternecer um velho ou fazer os dois rirem.

Ontem aqui, havia um parêntesis do mundo, um pequeno espaço onde o que prevalecia era o ser humano, onde não se falava em guerra, em crianças abandonadas, porque nenhuma estava abandonada, onde a política não existia, porque a política não é mais uma ciência de homens, apenas uma máquina de fazer monstros; ontem aqui, era possível ser feliz.

As crianças estavam com seus pais, coisa tão rara em nossos dias, e os seus rostinhos brilhavam como se fossem fluorescentes, talvez porque se sentissem importantes, privilegiados pela presença de pessoas que se dedicavam apenas a fazê-las sorrir.

Os homens, sempre tão compenetrados em fazerem juz ao sexo masculino, ontem aqui, eram apenas "gente"; gente que ri, que chora, que sofre, que perdoa, gente que vive.

E as mulheres... Ah! Benditas somos! Estávamos todas aqui, sem panelas, sem relógios, sem vassouras, só com a pequena parte que nos cabe de distração. E tivemos também nossos reis e nossas rainhas, tivemos também nossas fantasias...

E hoje eu voltei aqui... e havia um espaço tão grande!

Impressionante como a tristeza tem poder sobre o tamanho!

Como ela pode transformar um cubículo em infinito!

E hoje era tudo tão triste aqui!

O silêncio... as poucas luzes ajudando os trabalhadores a destruirem o que sobrou da alegria... as pessoas cabisbaixas andando pra lá e pra cá... a geral sempre tão frenética, amontoada num canto, entulho apenas... o trapezista, nada mais que um homem, igual aquele que senta no bar e bebe cerveja todos os dias... a moça do pêndulo da morte, parada na porta do carro, sanduiche na mão... e o mágico, de mãos tão suaves, movimentos ágeis, de repente está ali, carregando cadeiras, consertando motores, não é mais um rei...

O rei está na mala, carregada com esforço pelo equilibrista suado... e os índios já não são mais nada, com suas calças jeans.

Tudo acabou... o circo se foi.

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